Justificando - 16 de fevereiro de 2017
Não costumo divulgar ações realizadas no âmbito da minha atuação como defensor público. Isso se explica, em parte, pela aversão à autopromoção, mas, também, pelo fato de não me parecer fazer muito sentido propagar algo que nada mais é do que minha obrigação como servidor público (aqui, na acepção mais profunda da expressão).
Contudo, existem situações que nos marcam de uma forma diferenciada e derrubam preconceitos que possamos ter sobre qualquer temática. Vivenciei uma delas na última semana.
Quarta-feira, 08/02/2017. Recebo no Núcleo Regional da Defensoria Pública do Estado do Maranhão na Comarca de Santa Rita uma mãe, que poderia muito bem ser qualquer uma das milhões de mulheres batalhadoras e sofridas que lutam e sobrevivem pelos rincões do nosso país. Seu pedido, mais que uma demanda, continha uma súplica: “salve o sonho do meu filho”. A frase, além do efeito buscado por uma retórica incisiva, significou para mim uma responsabilidade e um temor acerca do conteúdo que viria a seguir.
Cumprindo a expectativa, Dona Nair (todos os nomes serão fictícios) relatou que seu filho, Pedro, terminou o ensino fundamental em dezembro de 2016 com o sonho de iniciar um curso técnico em logística no ano de 2017. Para atingir o objetivo, dedicou-se com afinco durante o ano passado e fez sua inscrição para o seletivo do Instituto Estadual de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão – IEMA. Egresso da escola pública, obteve rendimento superior a candidatos inscritos para a ampla concorrência e atingiu a sonhada aprovação. Dia 18/01/2017: resultado publicado. Sonho realizado? Como tudo na vida dos dois, não seria tão fácil.
Dona Nair compareceu no IEMA no próprio dia 18/01/2017, onde soube da aprovação do filho. Precisou pagar R$ 10,00 por trecho para se deslocar do local onde reside para a cidade vizinha onde se localiza o campus do Instituto. Como milhares de moradores de povoados de difícil acesso do interior do nosso país, mãe e filho não possuem computador em casa, smartphones ou acesso à internet, sendo até mesmo sinal de operadoras celulares fato raro na localidade. Não obstante, obteve a informação de que deveria acompanhar pela rede mundial de computadores o calendário de matrículas, uma vez que o único meio oficial de comunicação seria esse. Foi, ainda, informalmente avisada de que o período de matrículas duraria por volta de vinte dias.
Após alguns dias acometida por uma enfermidade, Dona Nair compareceu ao IEMA no dia 06/02/2017, prazo inferior aos vinte dias anteriormente informados, com toda a documentação do Pedro em mãos. Empolgada, qual não foi sua surpresa ao saber que havia perdido o prazo para matrícula e que seu filho não teria mais direito à vaga conquistada. Comunicaram-lhe que havia sido publicado no sítio eletrônico novo calendário de matrículas, tendo sido disponibilizado o prazo de quatro dias (31/01/2017 a 03/02/2017) para a entrega da documentação.
Mais uma vez, o Estado que falhou em providenciar àquela família o mínimo necessário para uma existência digna, tolhia um adolescente do seu sonho pelo fato do mesmo ser geográfica e digitalmente excluído. Numa esquizofrenia símbolo de uma sociedade em frangalhos, pune-se o excluído; massacra-se o segregado. Ao ouvir o relato, não consegui resistir à revolta e o embrulho que tomou conta de mim serviu para rememorar os motivos pelos quais decidi ser defensor público.
Não havia tempo para medidas administrativas. Naquele instante, já estava vigente o prazo de convocação dos candidatos excedentes. Passei a noite de quarta-feira redigindo a petição, que precisaria ser protocolizada na comarca vizinha, local onde se situa a sede do Instituto. Sigo na quinta-feira à tarde para a cidade contígua, onde sou recebido por um juiz não só diligente e técnico, mas, também, imbuído do verdadeiro senso de justiça, o qual concedeu a tutela de urgência liminarmente, determinando a imediata matrícula do Pedro.
Mandado devolvido com cumprimento na segunda-feira (13/02/2017). Matrícula, finalmente, efetuada na manhã de terça-feira (14/02/2017). Ao receber Dona Nair na Defensoria Pública no outro dia, olhar de reconhecimento, espírito aliviado, não havia como fugir à emoção. Ao sincero agradecimento, respondi com um ainda maior, daqueles que quem recebe não consegue sequer imaginar a veracidade e o alcance. O processo ainda seguirá seu rito, mas Pedro iniciará as aulas com sua nova turma, deixando-me com uma sensação que vai além do dever cumprido, difícil de traduzir.
Sei que diversos colegas vivenciam situações como essas diariamente. O ofício de defensor público nos coloca de frente com as mais absurdas situações e nos faz refletir dia após dia. Obviamente, não somos os únicos, muito menos os que encaram as maiores adversidades. Contudo, não consigo atravessar tais situações sem exercer a alteridade, tão rara nos dias atuais. Dessa forma, agradeço ao Pedro pela oportunidade de fazer algo relevante através do meu trabalho, porém, com a esperança de poder viver em um mundo onde, um dia, o meu papel não será mais necessário.
Victor Hugo Siqueira de Assis é Especialista em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais-PUC Minas e pós-graduando em Direitos Fundamentais pela Universidade de Coimbra. Defensor Público do Estado do Maranhão.
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